domingo, 16 de agosto de 2009


Hoje tive um vislumbre de um mundo novo, com outros jeitos e esperanças. As cores do entardecer mais vivas, mais reais e dias menos mortos. Outros amanheceres, pensamentos, insanidades, inconstâncias e chances. Tudo isso enquanto o vento batia no rosto. E num gesto, levanto as mãos para cima para, simplesmente, tentar alcançar o céu e sentir, na carne, as nuvens de algodão.
De repente distraio-me. Mochila nas costas, vento quente, ônibus lotado, uma trilha sonora imaginária guiando a jornada. Desço. Chego à realidade, entretanto suspiro (a fantasia chegou ao seu final temporário). Estou ciente diante disso tudo (em todas as suas vertentes, anexos, etc): mais do que promessas, expressões são necessárias, a fim de transformar a fantasia em realidade, superar os vícios. Porque o real, ao contrário do mundo de sonhos, não necessita apenas do pensamento. Ele pede por algo além, um levantar e puxar de mãos, gotas de suor e lágrimas, alguns caminhos solitários, todos os pensamentos sendo utilizados pelo cérebro (gerando impulsos nervosos), para transformar na carne, ou seja, em vida, os desejos da alma.
"- Traga fundo. E solta a fumaça quase sem respirar. - Foi então que vi aquelas ameixas e achei tão bonitas e tão vermelhas que pedi um quilo e era minha última grana certo porque meus pais não me dão nada e daí eu pensei assim se comprar essas ameixas agora vou ter que voltar a pé para casa mas que importa volto a pé mesmo pode ser até que acorde um pouco e aquela coisa lá longe volte pra perto de mim e então eu vinha caminhando devagarinho as ameixas eu não conseguia parar de comer sabe já tinha comido acho que umas seis estava toda melada quando dobrei a esquina aqui da rua e ia saindo um caixão de defunto do sobrado amarelo na esquina certo acho que era um caixão cheio quer dizer com defunto dentro porque ia saindo e não entrando certo e foi bem na hora que eu dobrei não deu tempo de parar nem de desviar daí então eu tropecei no caixão e as ameixas todas caíram assim paf! na calçada e foi aí que eu reparei naquelas pessoas todas de preto e óculos escuros e lenços no nariz e uma porrada de coroas de flores devia ser um defunto muito rico certo e aquele carro fúnebre ali parado e só aí eu entendi que era um velório. Quer dizer, um enterro. O velório é antes, certo?
- É - confirmo. - O velório é antes.
- Ficou todo mundo parado, me olhando. Eu me abaixei e comecei a catar as ameixas na sarjeta. Eu não estava me importando que fosse um enterro e que tudo tivesse parado só por minha causa, certo? Apanhei uma por uma. Só depois que tinha guardado todas de volta no pacote é que as coisas começaram a se mexer de novo. Eu continuei vindo para cá, as pessoas continuaram carregando o caixão para o carro fúnebre. Mas primeiro ficou assim um minuto tudo parado, como uma fotografia, como quando você congela a cena no vídeo. Eu juntando as ameixas e aquelas pessoas todas ali paradas me olhando. Você está prestando atenção? Aquelas pessoas todas paradas me olhando e eu ali juntando as ameixas."

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